segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Conto: Tolo

_ Você pode ver? – gritou enquanto apontava para o céu pobre de estrelas. - Você vê como elas iluminam? São belas sim, são belas, mas não se importam. Elas revelam sua beleza para qualquer homem que olhar pra cima à noite. E não se importam que nos apaixonemos por elas, mas nunca possamos tocá-las.

_ Você vê esse rio? – sussurrou enquanto apontava para a forte correnteza que gritava a sua frente. – Ouve o canto que te chama para mergulhar nessas águas? Sente a brisa que toca sua pele? Veja, veja! O luar! A lua se esconde em meio a essas ondas... Você quer tocá-la, não quer? Quer mergulhar e tomá-la nos braços. Mas você não sabe nadar! Seria culpa do rio se você se afogasse? Ou seria culpa sua, por entrar numa correnteza que sabia ser perigosa?

_ Tu vê aquela rocha? Aquela negra, que repousa no leito do rio? – Disse apontando a pedra que se distanciava da margem a distancia de três passos de um homem adulto. – Aquela é uma cadeira de sereias, é sim! Lá se senta a perdição dos homens... A sua perdição, porém, não é a sereia. É a pedra. Você, que coloca sua sereia sobre ela, e contempla sua beleza por todas as longas Eras. Quer ouvir sua voz, tão suave seu canto. Talvez com a brisa gelada do rio, possa sentir seu cheiro por além do véu da saudade. Mas, se fechar os olhos, e seu barco se despedaçar na rocha, será culpa dela, ou sua? Não foi você que acreditou que havia magia em uma simples rocha?

_ Você consegue enxergar agora, meu Coração? – Suspirou, sentando na grama úmida pelo orvalho, com a mão sobre o lado esquerdo do peito. – Você pode ver como são simples as coisas que você enfeita? Como são mentirosas as suas verdades? Como é cruel o mundo para os homens que deixam seus Corações falarem mais alto? Mas você acredita em destino, querido Coração. Você acredita no amor, mas você não mais é jovem. Queria eu insultá-lo: Inexperiente, covarde! – mas não posso, pois isso não és. És tolo, talvez, mas não covarde.

Deitou-se, com as mãos sob a cabeça, olhando para o céu. Nuvens de chuva foram trazidas pelo vento, e cobriam todo o firmamento até onde sua vista alcançava. – Olhe meu querido. As estrelas se cobrem, tímidas. Agora apenas seus amantes podem vê-las. Elas se apiedaram de nós, se esconderam, mas eu já sinto falta. Olhe, meu querido, elas também sentem nossa falta. Elas choram...

Impassível e indiferente, a chuva caia em lufadas. “Lavar toda a Terra, um pedacinho de cada vez” era a única coisa que ela dizia, com sua voz de trovão. Sabia, pois algum dia talvez tenha sido um deles, que devia haver sobre o verde algum romântico deitado, sonhando e flagelando o próprio coração. Mas não pensava nisso, afinal estava tão perto de suas amantes, as estrelas. Elas sorriam pra ele, dançavam, e piscavam sem descanso. Logo, elas o amavam, certo?